Aprenda a dizer ''não''

''APRENDA A DIZER NÃO'' - MATÉRIA DA REVISTA UMA (EDIÇÃO JANEIRO/2013)





Aprenda a dizer "não"

Você anda esticando demais a jornada, tem dificuldade de cumprir prazos e já não consegue atingir resultados tão bons quanto antes? Então, talvez esteja precisando usar mais vezes essa palavrinha mágica que, quando bem colocada, tem o poder de aumentar o valor que os outros dão ao seu trabalho. Faça o teste!

Por Rita Trevisan e Thaís Macena

As sucessivas crises econômicas que abalam o mundo e particularmente nosso país podem explicar, em parte, o surgimento de uma nova cultura organizacional que, vem impactando as relações de trabalho. "Nos últimos anos, as empresas, em geral, têm investido no corte de gastos e na redução das despesas para manter as mesmas margens de lucro. Isso demandou a redução do contingente de trabalhadores ao mínimo necessário para tocar os negócios, gerando estruturas mais enxutas, com menos níveis hierárquicos e uma concentração absurda de taregas em um número cada vez menor de colaboradores", analisa a consultora em liderança, desenvolvimento e gestão estratégica de pessoas, Verônica Rodrigues da Conceição.

As tecnologias também têm lá sua parcela de culpa na nova realidade que hoje se vê dentro da maioria das empresas. Afinal, nas funções em que se realizavam trabalhos repetitivos, seja na indústria, no comércio ou em serviços, os profissionais foram substituídos pela automação, sob a forma de robôs, controladores numéricos programáveis e computadores com softwares avançados. Com isso, muitos trabalhadores foram dispensados e aumentou a concentração de tarefas nos mais qualificados e preparados, em todas as áreas. "Esses poucos profissionais que ficaram foram obrigados a assumir diversas tarefas, personificando um novo tipo de colaborador, chamado de multifuncional", diz Verônica.

Porém, para dar conta de mais tarefas num mesmo período de tempo, e ainda desenvolver novos conhecimentos e competências, de acordo com as demandas impostas, é preciso, antes de tudo, uma boa dose de autoconhecimento. É isso que permite ao profissional reconhecer seus limites e preservá-los. E, nesse cenário, saber dizer "não" é cada vez mais uma habilidade importante. "Aprender a estabelecer limites é fundamental, primeiro consigo mesma. Depois, é preciso aprender a comunicá-los claramente para as outras pessoas", defende Verônica. É claro que não é tarefa fácil dizer a seu gestor que não pode entregar o que foi pedido no prazo porque já está sobrecarregada demais. No entanto, o que os especialistas garantem é que há estratégias acertadas para não assumir mais responsabilidade do que você pode administrar, sem correr o risco de parecer uma funcionária preguiçosa, desorganizada ou mesmo pouco comprometida com a empresa. E, acredite: quanto antes você aprender a fazer isso, melhor.

Menos estresse, mais saúde

Em primeiro lugar, aprender a impor limites às demandas que chegam até você, para trabalhar de forma mais tranquila, satisfatória e até mesmo prazerosa, é um jeito eficiente de prevenir doenças. "Em geral, o receio de ser substituído por um colega que aceite trabalhar em um ritmo alucinante faz que certos profissionais se sujeitem a condições e a quantidades de trabalho além de suas capacidades físicas e mentais. Porém, ao longo do tempo, se submetidos a um nível de estresse permanente, a saúde começa a ficar debilitada e, logo, aparecem as doenças", alerta Verônica.

Segundo um estudo da International Stress Management (ISMA-BR), as consequências mais comuns do acúmulo de estresse, na saúde, são as dores musculares, incluindo a dor de cabeça. "Também são frequentes os distúrbios de sono, problemas gastrointestinais, queda na libido e desequilíbrios de apetite e, nesse caso, a pessoa passa a comer muito mais do que necessita ou, então, muito menos", explica a psicóloga Ana Maria Rossi, presidente da entidade.

Além disso, não é raro ocorrer uma queda significativa na produtividade. Funciona assim: na tentativa de dar conta de tanto serviço extra, nos submetermos a jornadas mais longas no trabalho e, como resultado, abrimos mão de um tempo valioso de lazer e de descanso. Porém, a despeito de nosso esforço, o trabalho já não rende mais como antes, o que nos obriga a passar cada vez mais tempo no escritório, criando um círculo vicioso e perverso. "Todas as pessoas podem passar por picos esporádicos de trabalho. Porém, quando o excesso de trabalho é uma constante, a produtividade, a qualidade e a capacidade de gerar bons resultados começa a ficar comprometida", avisa Verônica.

Assim, trabalhar mais nem sempre é a chave da questão e a melhor saída seria realmente recursas algumas demandas ou, pelo menos, tentar negociá-las. "Admitir uma sobrecarga de trabalho, na esperança de garantir o emprego, é o mesmo que, numa partida de futebol, fazer um gol contra. Isso porque quem passa muito tempo na empresa acaba não rendendo tanto. Não resta dúvida de que com a vida pessoa e a profissional mais equilibradas, as pessoas trabalham mais motivadas e são capazes de dar seu melhor em cada tarefa executada", pondera Ana Maria.

Do jeito certo

Os sinais de sobrecarga e excesso de trabalho podem ser percebidos com relativa facilidade. Os primeiros sintomas que surgem são o cansaço físico, que se prolonga dia após dia, e a fadiga mental, trazendo dificuldade de concentração e de tomada de decisões. "Outros sinais comuns são a irritabilidade e a impaciência com as tarefas e com as pessoas e as dificuldades de relacionamento. E tudo isso traz efeitos negativos na percepção de seu chefe sobre você", alerta Verônica.
Não conseguir cumprir prazos também é um indício claro de que você está tentando assumir mais responsabilidade do que conta de tocar.

E se você se identificou com o perfil de profissional descrito até aqui, a hora de agir é agora. Comece treinando sua capacidade de recusar determinadas demandas, porém não faça isso de forma deliberada, ou sem pensar. "É fundamental falar 'não' de vez em quando. Mas a melhor técnica para se falar o 'não' é oferecendo uma solução para a situação, no momento momento, ensina Renato Grinberg, especialista em liderança, desenvolvimento profissional e gestão de empresas. Para completar, é fundamental argumentar, usando dados objetivos que deixem bem claro a seu gestor que não se trata de falta de vontade de sua parte. Abaixo, diversos especialistas em carreira ensinam como exercitar o "não posso" ou "não devo" sem medo de ser feliz. Aliás, muito mais feliz, tanto no trabalho quanto fora dele. Confira:

Dê a seu gestor a oportunidade de refletir:

Em boa parte dos casos, se seu supervisor for uma pessoa minimamente sensata, você nem precisará dizer "não" a ele para se livrar de uma demanda que definitivamente não cabe a você. Basta que você questione de modo claro e objetivo. Por exemplo: se você recebe uma tarefa que não está dentro de suas responsabilidades, pergunte a seu gestor por que foi escolhida para executá-la, já que esse não é seu expertise ou sua área de atuação prioritária. Explique também que assumir essa demanda fatalmente a levará a deixar outras tarefas para mais tarde, o que pode impactar de alguma forma no cronograma estabelecido. "Isso vai fazer seu gestor refletir e você provavelmente nem precisará dizer 'não' a ele", garante Silvia Specchio, CEO da Fellipelli, empresa especializada em soluções para gestão estratégica de pessoas.

Monte um cronograma de suas tarefas:

Outra alternativa, antes de dizer "não" a seu chefe, é marcar uma reunião para apresentar todas as suas demandas e um cronograma no qual elas aparecem listadas, com um prazo mínimo para a execução. Taí mais uma boa oportunidade de fazer seu gestor refletir e decidir, por si mesmo, que as responsabilidade delegadas a você são, de fato, exageradas.

Se necessário, renegocie prazos: 

Avalie, junto a seu chefe, quais são os impactos das demandas extras nas tarefas que você já tinha de entregar, estabeleça prioridades e renegocie os prazos. "Atrasar sem posicionar seu gestor é o que faz você perder a credibilidade e não o atraso em si", avalia Renato. Outra dica: se já renegociou os prazos uma vez, faça o máximo para cumprir o que foi combinado.

Ofereça soluções, em vez de problemas:

Para não deixar seu chefe ainda mais insatisfeito, não comunique apenas que não está dando conta de um determinado projeto ou dos vários projetos que estão sob sua responsabilidade. Tenha já uma proposta em mente para oferecer a seu gestor, de modo a resolver o problema, atendendo, de alguma forma, aos interesses dos dois. "Você pode sugeir, por exemplo, um remanejamento de tarefas. Deixar tarefas menor urgentes para mais tarde e dar foco total no que tem deadline mais curto", sugere José Roberto Marques, presidene do Instituto Brasileiro de Coaching (IBC).

"Delegar algumas tarefas a terceiros também é uma alternativa. Para isso, você e seu chefe devem considerar quais atividades podem ser realizadas para outras pessoas da equipe, sem nenhum prejuízo, para que você possa se concentrar naquelas que verdadeiramente agregam valor se forem realizadas por você, onde você deverá colocar toda a sua experiência em favor da empresa", completa Verônica.

Mantenha seu chefe sempre informado de sua rotina de trabalho:
se estar sobrecarregada na empresa já se tornou uma constante, vale a pena gastar mais tempo, em seu dia a dia, para escrever relatórios e planilhas de acompanhamento, e entregá-los a seu chefe, periodicamente. "Assim se você precisar dizer 'não' em algum momento, seu chefe estará ciente de sua carga de trabalho e dos prazos estabelecidos para as demandas anteriormente assumidas. Nessa situação, dificilmente irá interpretar sua recusa como má vontade ou descaso', ensina José Roberto.

E, por fim, seja assertiva:
isso significa treinar sua capacidade de dizer objetiva e claramente o que precisa ser dito, mostrando e defendendo seus pontos de vista com convicção e, ao mesmo tempo, transmitindo respeito e consideração pelo interlocutor. Essa competência garante que sua mensagem será perfeitamente entendida e aumenta muito as chances de que seu pedido, ou sugestão, seja acolhido por seu superior. "Não é preciso ter medo de dizer 'não'. O essencial é ter mente que os profissionais que sabem se valorizar e impor os limites necessários costumam ser também os mais produtivos, focados, comprometidos e eficientes em sua função. Eles é que trazem os melhores resultados para a empresa e costumam ser bons exemplos e modelos de atitude e comportamento para colegas e subordinados", diz Verônica. A consultora da área de liderança e gestão também afirma que essas pessoas são geralmente as mais equilibradas, dispostas e criativas da equipe. E, até certo ponto, ser uma profissional desse tipo depende única e exclusivamente de seu autoconhecimento, de sua capacidade de proteger seus limites e de valorizar a si mesma e ao trabalho que é capaz de desempenhar. Pense nisso!

0 comentários:

Postar um comentário